Em 1º de outubro se comemorou o Dia Mundial dos Direitos do Idoso, e o envelhecimento da população é, hoje, realidade mundial. Os progressos da ciência e dos direitos de cidadania contribuíram para que a expectativa de vida tenha dobrado em comparação com o século passado, apontando evidente salto civilizatório.
Essa nova realidade mundial enseja mudanças nas prioridades das políticas públicas e na relação entre Estado e sociedade, assegurando que a ampliação da longevidade seja acompanhada de maior qualidade de vida.
No Brasil, ao lado de avanços na proteção dos direitos do idoso, registrados em duas décadas de reconstrução democrática, seguem ocorrendo violações cotidianas que vão das atitudes de discriminação ou descaso até gravíssimos episódios de cárcere privado, sequestro do cartão de acesso a benefícios sociais, violência física e até mesmo sexual.
O reconhecimento dos direitos da pessoa idosa vem evoluindo, no âmbito nacional, por meio do diálogo com a sociedade e da coesão entre as políticas públicas. Nos últimos oito anos, foram realizadas a 1ª e a 2ª Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa Idosa (2006 e 2009), que propuseram a Rede Nacional de Proteção e Defesa da Pessoa Idosa (Renadi). Contribuíram nesse processo a adoção da Política Nacional do Idoso e a aprovação do Estatuto do Idoso.
A valorização da pessoa idosa e a promoção de sua participação na sociedade são objetivos estratégicos do Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3). Poderes públicos e representações da sociedade civil partilham responsabilidades e formulam propostas de políticas de governo no Conselho Nacional dos Direitos do Idoso, organismo que possui - ou deveria possuir - o seu correspondente nas 27 unidades da Federação e em cada município.
Esses instrumentos e políticas nacionais consolidam a compreensão de que homem se mulheres idosos são sujeitos de direitos, não seres destinatários de caridade, compaixão ou dó.Tal mudança de paradigma se apoia na ideia de que a atenção aos idosos se insere no âmbito das políticas de Direitos Humanos, cujo fundamento diz respeito à dignidade intrínseca da pessoa. Foi com essa orientação que o governo brasileiro transferiu a coordenação da política nacional do idoso para a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, dando-lhe transversalidade.
Desde a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), as Nações Unidas constroem um robusto sistema de proteção aos segmentos vulneráveis da população, munindo cada um deles de uma convenção específica com força vinculante e compromissos compulsórios para as nações aderentes.
Mulheres, crianças, migrantes e pessoas com deficiência já possuem um instrumento específico. Mais recentemente foi aprovada uma declaração para assegurar os direitos dos povos indígenas.
Nos últimos anos, o Brasil desenvolve iniciativas, em parceria primordial com a Argentina, para iniciar discussões na ONU sobre as bases de uma Convenção Internacional dos Direitos do Idoso. A Secretaria de Direitos Humanos articula ações como Itamaraty para levar adiante esse debate, que ganhou destaque na Conferência Mundial sobre o Envelhecimento, em Madri (2002), e no prosseguimento dela, em Brasília (2007), com o nome "Madri+5", cuja declaração oficial convoca à construção da nova convenção e demanda a criação de uma relatoria especial das Nações Unidas para o tema.
Elaborar um instrumento normativo internacional vinculante que proteja os direitos do idoso significa retirá-los de uma condição de invisibilidade, reconhecendo-lhes direitos e obrigações capazes de assegurar condições de cidadania plena. A adoção de uma convenção internacional permitirá estabelecer um quadro conceitual, legal e de responsabilização para cooperação entre governos, organizações da sociedade civil e segmento empresarial visando eliminar a discriminação relacionada à idade. Já a Relatoria Especial possibilitará o monitoramento desses direitos por relatores independentes que se reportam ao Conselho de Direitos Humanos da ONU.
O caminho para a criação de instrumentos internacionais exige esforços pacientes para a busca de consensos entre as nações.
O primeiro passo já foi dado, com a aprovação pelos países do Mercosul da proposta de Convenção. No âmbito da 18ª Reunião de Altas Autoridades de Direitos Humanos e Chancelarias do Mercosul, realizada de 18 a 20 de outubro, em Brasília, sob a presidência pró-tempore do Brasil, um seminário apontou caminhos para avançar na construção de uma convenção internacional e de uma relatoria especial. Nesta semana, o Brasil participa de sessão especial na OEA, em Washington, que discute uma convenção sobre o tema no âmbito interamericano.
Com esses passos concretos, o país celebra a passagem da data internacional dos direitos da pessoa idosa, atuando na vanguarda de uma iniciativa que comprova que, no Brasil, as políticas públicas de Direitos Humanos são vistas como políticas de Estado. É mais um indicador de que a democracia brasileira se apoia em sólidas bases institucionais e já começamos a despontar como referência mundial em aspectos que pouca gente ousaria sonhar até períodos recentes.
(*) Ministro da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República.
Artigo publicado originalmente no jornal Correio Braziliense, 28 de outubro de 2010
Fonte: SDH - 29/10/2010
http://www.direitoshumanos.gov.br