Luciana Abade ,
Jornal do Brasil 14/3/2009
BRASÍLIA - A nomenclatura evoluiu. De velhos, eles passaram a ser chamados de idosos, posteriormente de integrantes da terceira idade e, agora, da melhor idade. O melhor, no entanto, é para poucos, porque, na prática, falta à maioria dos brasileiros com mais de 60 anos acesso aos transportes gratuitos, acompanhamento médico de qualidade e remuneração decente na aposentadoria. Nesse cenário, dizer que falta respeito é redundante. As entidades que lutam pelos direitos dos idosos afirmam que apesar dos avanços trazidos pelo Estatuto do Idoso, o Brasil, que já conta com uma população de 19 milhões de pessoas com mais de 60 anos, mostra que ainda tem um longo caminho a percorrer para alcançar uma cidadania plena para as pessoas dessa faixa etária.
Uma das principais queixas é o não cumprimento da determinação de gratuidade do transporte intermunicipal para pessoas com mais de 60 anos. Depois de receber várias denúncias, o Ministério Público de São Paulo realizou, na última quarta-feira, uma audiência pública com empresas de transporte interestaduais e intermunicipais com sede na capital para firmar um termo de ajustamento de conduta. As empresas recusaram-se a assinar o termo alegando que as infrações são eventuais. Caso não mudem de idéia em 20 dias, o MP-SP moverá uma ação indenizatória contra elas em casos de reincidência.
Situação crítica
O desrespeito ao artigo do estatuto que determina a gratuidade aos passageiros com mais de 60 anos nos transportes urbanos também é grande e, no Rio de Janeiro, a situação é crítica.
– Muitas vezes não aceitam a carteira de identidade como comprovante. Se não bastasse esse absurdo, algumas empresas desativam linhas que são muito usadas por idosos – denuncia a coordenadora do Fórum Estadual de Política do Idoso do Rio de Janeiro, Maria José Ponciano.
Segundo a titular da Delegacia da Terceira Idade do RJ, Catarina Noble, alguns motoristas afirmaram em depoimentos que são punidos pelas empresas por pararem para muitos idosos. As catracas eletrônicas têm permitido esse acompanhamento.
A violência contra o idoso é outra mazela que insiste em permanecer e é ainda mais difícil de mudar porque além de políticas públicas, necessita de uma mudança cultural. Estudo realizado nas 27 capitais brasileiras pelo pesquisador da Universidade de Brasília, Vicente Faveiros, mostra que 54% das agressões contra os idosos são cometidas pelos parentes, geralmente filhos. O fato dificulta a ação do Estado, mas não exime sua responsabilidade. Devido à falta de estatísticas nacionais consolidadas, o pesquisador precisou recorrer aos ministérios públicos e disque-idosos estaduais, além de delegacias nos 26 estados e no Distrito Federal para levantar as 14.803 denúncias ocorridas em 2005.
O subsecretário de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos da Secretaria Especial de Direitos Humanos, Perly Cipriano, garante que no segundo semestre desse ano será lançado um disque 100 para receber denúncias de violência contra idosos. Mas a fragilidade do sistema não para por aí.
– O encaminhamento das denúncias também encontra dificuldades – afirma Maria José. – Faltam profissionais para acompanhar os casos. No Rio de Janeiro, temos apenas dois promotores para cuidar dos interesses dos idosos.
Na próxima quarta-feira, começa em Brasília a 2ª Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa Idosa. Durante três dias mais de 500 representantes das conferências estaduais e municipais, que reuniram 60 mil pessoas e antecederam o evento, vão avaliar a rede nacional de proteção e defesa da pessoa idosa. A julgar pela demanda que a maioria das entidades que participarão vão levar na mala, a estadia na capital pode ser curta demais.